Luanda tem uma coroa de musseques, fruto de uma organização
urbana antiga e consolidada, desenhada em
planos de ordenamento elaborados até ao meado do século XX, época em que
o crescimento da cidade ultrapassou em velocidade e desordenamento os planos
que os burocratas iam elaborando. À volta do núcleo citadino mais nobre, institucional
e comercial, havia (e há hoje) bairros populares que alimentam a cidade de
mão-de-obra e se alimentam dos empregos lá existentes; o caminho-de-ferro que
os atravessa foi (e se não é, devia continuar a ser) motor dessa estrutura,
passava pelos bairros populares a caminho das riquezas produzidas no interior
do País.
Apesar de residir numa ponta do Distrito Urbano do Rangel, não
consta habitualmente dos meus planos de fim-de-semana embrenhar-me no Rangel, o
Bairro, ir até ao Triângulo dos Congoleses, percorrer o mercado do Tunga-Ngo, costas
voltadas para o insano aterro (in)sanitário ao lado da via férrea, ir até ao pé
da estação dos Musseques com cuidado para não atropelar os candengues (somos todos irmãos, né?) nem
derrubar as balizas improvisadas do futebol de rua, evitando atascar a viatura
e as catraias saltitando na areia do caminho, na tarde amena. Mas avizinha-se o Dia de África e impõe-se o
uso de traje africano: assim, combinámos subir a Avenida em devido tempo
renomeada Hoji-ya-Henda-Herói-Nacional que provavelmente deveria ser mais
conhecido ao menos como nome de rua, se bem que não ficaria nada mal em Luanda continuar
a haver uma Avenida do Brasil na direcção do Cazenga, ao encontro da Dona L.
ali para os lados da agência do Banco do
lado esquerdo, para nos levar pela mão ao local onde se podem
comprar os ditos trajes.
Talvez uma samacaca, imagem forte, colorida, talvez... Como
seria de esperar, fomos bem recebidos na sala cozinha asseada verde gritante e
musica do rádio com o volume no máximo que hoje é Sábado, pela mesa desfilaram
e se avolumaram vestidos vários, artigos genuínos, variados, coloridos, giros, bordados,
interessantes, folhos do Bengo, rodados, em várias medidas, mais manga menos
alça, vestido comprido estampado e composto com sandália a condizer, ela vai
bem fixe para a festa por uns módicos kwanzas; eu creio que não terei grande
oportunidade para festejar coisa nenhuma, com a agenda da semana a ressentir-se
de um pico de actividade que começou há um par de semanas e que tende a
eternizar-se. Diz-se que os primeiros 90% de um projecto consomem 90% do tempo
previsto para a finalização do trabalho; os restantes 10% do projecto, consomem
os outros 90% do tempo planeado... Talvez compre uma túnica tradicional qualquer
dia.
Esta parte do Rangel, se bem que às portas de Luanda, faz
parte daqueles sítios onde nos recomendavam em tempos só ir com guia e ir só de
dia. Que exagero, dirão alguns que conhecem e me conhecem e já passaram comigo por sítios
muito mais impróprios e sem guia (e de noite!) pois, vá lá, pode não ser o mais
exemplar bairro de Luanda, mas é arrumado e decente q.b. para uma excursão
dedicada a umas compras bem definidas. As obras da avenida eternizam-se em pó e
valas e solavancos, e buracos, e barreiras e quarta-feira será Dia de África,
um momento para reflectir, depois festejemos!
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